Respeitarmos-nos significa valorizar a nós
próprios, entendendo quem realmente somos e o que assumimos nesta jornada para
estarmos num corpo de carne e osso, aqui e agora, nesta Terra.
Foi um salto de fé, e no fundo do nosso
ser há uma crença, uma força, uma consciência profunda que nos fizeram escolher
estar aqui.
Nós dissemos “sim” para esta encarnação,
para a nossa vida actual.
O instante em que dissemos “sim”
fundamentou-se num conhecimento muito profundo, entretanto dúvidas logo
surgiram, devido a antigas lembranças de experiências de outras vidas na Terra.
Essas dúvidas encobriram o “sim” claro e
óbvio, e fizeram com que ele se tornasse nebuloso e obscurecido.
Nós sentimos-nos perdidos nesta
experiência terrena, sozinhos e abandonados.
Jeshua conhece essa dor, pois Ele mesmo
a vivenciou.
Muitas vezes tem sido retratado com um
santo, um iluminado que sabia tudo.
Mas não foi bem assim, pois passou por
dúvidas e medos intensos.
Isso fazia parte da sua jornada, como
faz da nossa.
Então vejamos-lo na sua imperfeição, na
sua fragilidade.
Quando viveu na Terra, foi inspirado por
uma luz da qual gostaria de dar testemunho; uma luz que está além das palavras,
que contém amor, encanto, beleza, humor e sabedoria.
Essa luz não era sua, mas era doada por seu
intermédio, exactamente como acontece com cada um de nós.
Mas Ele também tinha momentos de
profundo desespero, devido à falta de entendimento daqueles que o cercavam, por
não se sentir reconhecido… assim como acontece connosco.
E foi por isto que conseguiu atingir
pessoas que eram muito solitárias; pessoas desesperadas, que sofriam, tanto
física quanto emocionalmente; pessoas que se encontravam num terreno espiritual
árido, inculto.
Ele podia entender essas pessoas, porque
vivenciara, em si mesmo, as emoções, os estados de espírito e os pensamentos
que elas estavam experimentando.
A experiência humana, com todos os seus
altos e baixos, é necessária para que a nossa luz possa brilhar aqui.
O que experimentamos agora em nossa vida
como trevas, tristeza, obstáculos – tudo isto faz parte da nossa jornada.
Não são empecilhos que deveríamos
evitar.
Têm mais a ver com a nossa capacidade de
aceitarmos estas coisas e levarmos a luz do nosso coração para elas, assim como
uma pedra bruta pode ser despertada para a bela pedra preciosa que ela é
internamente.
Esta é a nossa tarefa: vivenciar a
escuridão, entendê-la a partir de dentro, e então iluminá-la e enfrentar toda a
gama da experiência humana; envolvê-la com consciência e senti-la
completamente.
E assim a energia do Cristo desperta no
ser humano – mas, para que isto aconteça é necessário ser um humano.
Não é possível desenvolver essa energia,
esse poder singular e o brilho exclusivo da energia Crística, nos reinos
altamente etéreos, onde faltam a resistência e intensidade da experiência
humana.
Então, percebamos que o que
aparentemente nos retêm, que nos faz resistir, que nos desencoraja ou incomoda,
e que talvez detestamos, é exactamente o nosso propósito – o motivo de estarmos
aqui.
É uma experiência mágica ajudar outro
ser humano a iluminar-se a partir de dentro, de modo que se transforme em um
ser através do qual podem acontecer milagres.
Existem histórias sobre milagres que Jeshua
realizou, sobre curas físicas e mentais repentinas.
Mas o poder que Ele tinha não era o de
um mágico; não era um truque místico.
Ele conseguia atingir pessoas que estavam
prontas para isso, que estavam no ponto de vivenciar uma ruptura no nível
interno, através do seu entendimento profundo da natureza humana.
Ele não fazia nenhum tipo de julgamento
a respeito de quem elas eram, de seus aspectos negativos ou positivos; Ele
simplesmente estava lá.
E havia pessoas que, quando estavam com
Ele, experimentavam o amor, e esse amor as tornava íntegras, inteiras.
Era como se sua natureza fosse chamada a
despertar de repente, e era isto que acontecia em tais momentos mágicos.
Não era algo que Ele fazia de facto, mas
algo que acontecia na interacção entre si e as pessoas.
O facto de Ele estar aberto era o que o
possibilitava receber a luz do Cristo e ser capaz de transmiti-la a outros.
E esta abertura, da qual se fala, muitas
vezes é alcançada por um ser humano através da vivência de uma crise.
Geralmente ficamos presos a todo tipo de
crença sobre o que pode ou não acontecer, ou o que deve ou não dever ser, antes
de realmente nos abrirmos para a luz de Cristo.
Nós estamos cheio de ideias e padrões de
pensamento que criam uma infinidade de emoções e estados de espírito.
Nós tentamos moldar o nosso mundo, a
nossa vida, a partir de tais ideias e padrões, até nos defrontarmos com algo
tão enorme que não conseguimos encontrar nenhuma forma aceitável de evitá-lo, e
então todas as nossas certezas, crenças e padrões de pensamento caem por terra.
Nós caímos num poço profundo que pode-nos
causar um medo esmagador.
Nós podemos, inclusive, chamar isso de
“noite escura da alma”, que é realmente uma experiência assustadora.
Ao mesmo tempo, ela traz a possibilidade
de nos abrirmos e percebermos que não sabemos mais qual é o modo “certo” de ser
e agir, e então uma parte nossa desiste, enquanto outra parte se abre.
A parte que desiste é a defensiva, a
resistente, que sempre pensa que sabe mais; é a impaciente, que quer e exige
todo tipo de coisas da vida.
Essa parte geralmente definha numa
crise, e se tivermos a coragem de deixá-la morrer, a luz poderá começar a
brilhar no nosso interior.
Aqui podemos ver que uma crise – uma
experiência que nos parece demais para ser digerida – também tem o potencial
para ser uma abertura para a luz.
Mas esta é uma experiência muito
intensa, porque a parte que morre não quer morrer – ela deseja persistir… e
resiste.
Tragamos à nossa mente a nossa parte que
é oposta à nossa luz e contra a luz em geral, contra a luz do cosmos que deseja
fluir através de nós.
Algo dentro de nós deseja proteger-se
contra essa possibilidade; então sintamos, se pudermos, a hesitação, quando
imaginarmos a luz fluindo através de nós com muita facilidade e livremente,
através de todas as partes do nosso corpo e para fora, para todo o mundo.
O que esta imagem invoca em nós?
Podemos aceitar esta possibilidade?
Sentimos que isto é possível?
Ou existe algo em nós que deseja se
proteger, se defender?
Se for este o caso, olhemos para esta nossa
parte protectora e vejamos-la diante de nós como um guardião.
Perguntemos a nós mesmos: “Por que
preciso deste escudo?”
Levemos a sério esta defesa, porque há
algo em nós que sente a necessidade de ter esta protecção.
Respeitemos esta parte nossa porque o
escudo sempre tem um propósito.
Ele está aí para proteger uma parte nossa
muito vulnerável.
Que parte nossa não permitiria a luz?
Que parte nossa a vivencia como algo que
é demais para se pedir a nós, ou como uma ameaça, ou até como algo perigoso?
Aproximemos-nos dessa nossa parte
gentilmente, como se ela fosse uma criança.
Vejamos-la como uma criança que se tornou
desencorajada, uma criança que voltou sua energia vital para dentro.
Aproximemos-nos dessa criança muito
delicadamente e vejamos o quanto ela é bonita; ela ainda irradia beleza, mesmo
com essa vulnerabilidade e defensiva extremas.
Ajoelhemos-nos diante dela e envolvamos-la
com a nossa generosidade e bondade.
Ajoelhemos-nos em carinhosa aceitação,
sem querermos que a criança mude, sem querermos impor nada a ela.
Sentemos-nos tranquilamente,
relaxadamente, com essa criança e sintamos como poderíamos tomar o lugar desse
“escudo”.
Até agora, a criança vem se sentindo
protegida por essa barreira defensiva entre nós e o mundo exterior, mas essa
protecção é também uma barreira entre nós e nossos sentimentos mais profundos.
Perguntemos à criança se podemos
substituir o escudo.
Simplesmente perguntemos: “Tu me
permites tomar conta de ti? Isto estaria bem para ti?”
Perguntemos sincera e abertamente:
“Estou a proteger-te o suficiente?”
E deixemos que ela fale livremente.
Talvez ela diga “Não, não me sinto
suficientemente segura. Estou com medo.”
Perguntemos-lhe, então, do que ela precisa,
ou o que podemos fazer para que ela se sinta segura.
Usemos o tempo que for necessário para
fazer isto; nós podemos ter esta conversa com a nossa criança interior várias e
várias vezes.
Ela é um ser vivo, uma parte de nós que
carrega muito amor, e, portanto, tem muito amor para dar.
Mas precisaria sentir-se segura na
Terra, e é por isto que a nossa delicadeza e lealdade são necessárias.
Ao construirmos uma barreira defensiva,
um escudo para protegermos e escondermos a nossa criança interior, deixamos de
estar conscientemente conectados com ela; ela passa a ficar escondida de nós.
Em certos momentos da nossa vida, nós
saltamos na defensiva, por exemplo, ou nos fechamos completamente, sem sabermos
por que isto está acontecendo.
Nós podemos ficar com raiva, ou
frustrados, ou desanimados, ou desencorajados…
Quando isto acontece é porque existem
padrões reactivos automáticos em acção, que se colocam entre nós e a nossa criança
interior.
Ao renovarmos a conexão com essa criança
vulnerável em nosso interior, e começando a conversar com ela repetidas vezes,
aos poucos poderemos encontrar uma forma de resolver esses padrões reactivos
automáticos – a barreira defensiva – mas isto requer paciência e delicadeza de nossa
parte.
E também que entendamos, muito
profundamente, que esta nossa parte vulnerável não é nenhum obstáculo que deva
ser evitado ou vencido, e que ele não deve ser eliminado.
A intenção é que cresçamos por meio
dessa criança, envolvendo-a com compreensão e amor, para que depois a luz
Crística desperte em nós.
A partir desse momento, ficam para trás
todas as nossas ideias fixas, julgamentos e crenças, assim como o esforço e a
luta incessantes por algo que pensamos que precisamos.
Em vez disto, surge em nós uma
disposição e abertura para nos encontrarmos connosco mesmos, sempre que
necessário, com atenção e admiração.
Ao abandonarmos a certeza de que nós já
sabemos o que precisamos e o que é bom para nós, nós nos permitimos surpreender-nos
com as respostas da nossa criança interior.
Este é o nosso caminho, porque a alma
tem algo a aprender com a experiência humana.
Às vezes nós vemos o céu – o mundo ao
qual as almas pertencem – como um mundo perfeito, mas também um mundo do qual fomos
banidos.
E fomos forçados a sobreviver em um
mundo imperfeito e muitas vezes estranho – a Terra – onde tantas emoções nos
abatem; e tudo isto nos parece um castigo.
Mas o plano de onde viemos – o mundo da
alma – também não é perfeito.
Há algo essencial faltando lá, e é por
isto que temos sempre dado o salto de fé para a encarnação.
É a própria vida – esta busca tacteante
(que procura sentir, que procura entender), este modo intenso de experimentar,
que é possível especialmente na Terra, através do qual o nosso entendimento, nossa
paciência, percepção e compaixão tornam-se profundos e substanciais.
Este é o significado espiritual da vida
na Terra.
Os vislumbres de perfeição que podemos
vivenciar aqui – muitas vezes em momentos de simplicidade, ou através de
insights, ou de alguma experiência de puro contentamento e beleza – esses
vislumbres têm mais peso e valor do que simplesmente manter-se em estado de
euforia durante anos nos reinos celestes.
Certamente é maravilhoso estar numa
atmosfera de harmonia, com menos resistência e menos altos e baixos; e nós ansiamos
por isto.
Mas não neguemos a beleza e o profundo
valor espiritual da vida na Terra, em tudo o que estamos passando agora.
Levemos a experiência, a sabedoria e os
avanços, que vivemos aqui, para os reinos de luz, e esses reinos adquirirão
mais substância e vivacidade com isso.
Existe uma interacção constante entre o
plano da Terra e os planos “do outro lado”.
Apreciemos a nossa própria vida e
consideremos-la valiosa.
Nós somos corajosos; nós agimos com
força e poder; portanto reconheçamos a nossa própria luz.
Como é ser um humano!?
Sim, existem os pesos, mas há também
momentos de leveza, amizade e solidariedade, que tocam a alma muito
profundamente.
Os laços de amizade, construídos aqui na
Terra, permanecem com a alma e continuam fazendo seu trabalho para sempre – tão
preciosa é a vida na Terra!
Gratidão,
Luís Barros